Eu subiria na mesa escura para afastar as pesadas cortinas escuras, e ali ficaria debruçada, a observar o cair da neve. Passaria a noite em silêncio, esperando eternamente que cada um dos flocos esbranquiçados alcançasse o solo, e desaparecesse em meio àquele mar de algodão, fazendo-o aumentar aos poucos - até, quem sabe, envolver lentamente as janelas, as cortinas e toda a casa, no silêncio da noite, encobrindo tudo, engolindo a si mesmo.
Pois é, fiquei três dias sem postar, e quando volto estou pensando nisso. É que a vida é feita de altos e baixos, e na minha eles sempre se alternaram em questão de horas, então há o que escrever a todo momento; nos últimos três dias, entretanto, a queda livre tem tornado impossível pensar em qualquer coisa por mais de quinze segundos. Agora, enquanto abasteço-me de textos e fotografias e todo tipo de lembrança de outros períodos obscuros dessa mesma vida, percebo que é verdade que só se vive uma vez: as lágrimas que já sei como secar, essas não voltarão.
Desanimador é também o clichê de só conseguir pensar em morte. Talvez porque a vida seja complexa demais - é sempre vida e cansa e engana e desespera. Sim, essa é a última coisa que eu teria gostado de escrever nisto aqui. Mas sou um poço de raiva e mágoa, aos poucos evoluo para o ressentimento e o ódio, e não há nada que me faça voltar a enxergar as coisas de maneira racional.
Porque racional, aliás, nunca soube ser e tampouco fiz questão; a diferença é que antes agia com o coração e cometia atos inocentes. Agora ele está sujo, e até que haja tempo de renovar todo o sangue deste corpo, transcorrer-se-á tempo suficiente para que tudo mude mais uma vez, e outra, e mais outra. No fim, inevitavelmente, tudo terá sido inútil.
Talvez eu subisse novamente na mesa para puxar as cortinas da cor do vinho de volta ao seu lugar. Então desceria, procurando não fazer barulho, caminharia até a porta à esquerda das grandes janelas e giraria a maçaneta no sentido anti-horário, para sentir o vento surpreender-me com um gélido golpe nas faces. E caminharia por sobre a neve amontoada no quintal, no solo outrora negro, deixando um sutil porém intenso rastro de gotículas vermelhas.
Perdendo sangue, ganharia forças para refletir. Não sei exatamente quando deixei de ser feliz, mas esse não é o problema - é que não sei quando voltarei a sê-lo, e sobretudo como.
Mas assim é a vida, refugio-me na morte para não ter que pensar em como sair dela, até o dia em que acordarei viva de novo.
E eu não sei que estou morta, não faço a menor ideia disso e se me contassem eu não acreditaria - mas estou, entende?
Ainda espero que a montanha que agora se formou no quintal sob a goiabeira continue crescendo. Que a neve se una ao branco inatingível do céu, acima das folhas verde escuras já quase sem vida. E que meu corpo possa ser envolvido em seus braços mornos.
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Há 6 anos
2 comentários:
Inert conscience of a lost soul, acts concealed will be said , stated words will become deaf.
"Dass jede Minute dieser Nacht dauern mehr als die Ewigkeit"
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